livros,

Resenha: O Oceano no Fim do Caminho

12:01 Isabela Libório 2


“Eu já estivera ali, não estivera, muito tempo atrás? Tinha certeza que sim. As memórias de infância às vezes são encobertas e obscurecidas pelo que vem depois, como brinquedos antigos esquecidos no fundo do armário abarrotado de um adulto, mas nunca se perdem por completo.”

   Sempre tive muita vontade de ler algo escrito pelo Neil Gaiman, mas nunca tive oportunidade. Esse sentimento surgiu depois que assisti ao filme Coraline – baseado no livro do mesmo e dirigido por Henry Selick, apesar da minha certeza anterior de que o diretor era Tim Burton - e fiquei encantada com a criatividade e originalidade da história.

   O Oceano no Fim do Caminho me chamou a atenção desde que a Editora Intrínseca anunciou seu lançamento, tanto pela capa quanto pelo autor. Já comecei ouvindo falar muito bem da obra! A vontade só aumentou e tenho orgulho de ter comprado e lido esse livro tão sensacional.

   A história é narrada em primeira pessoa por um homem cujo nome não sabemos – e continuamos sem saber, até mesmo na última página. Após décadas sem colocar os pés na casa em que passou sua infância, se vê dirigindo até o local novamente para comparecer a um funeral. Suas memórias daquela época andavam escurecidas, embaçadas, mas voltar àquela região lhe traz muitas lembranças que, talvez, o tempo tenha apagado por terem sido tão sombrias e surreais. Ao avistar o lago que havia ali, sente-se orgulhoso por tudo lhe vir à mente novamente. Quer dizer, lago não, nem mar. Oceano. “O Oceano de Lettie Hempstock”.


  Ficamos logo cientes de como era solitário o seu passado quando o personagem conta as situações pelas quais passava. Ele tinha sete anos quando seus pais passavam por uma crise financeira e tiveram que alugar seu quarto para conseguir um novo meio de sustentar-se. Todo tipo de pessoa já havia passado por ali, até que surge o responsável por mudar toda a história: o minerador de opala.

  Um dia, o garoto não encontra o carro do pai na garagem e o chama, intrigado com o acontecimento. Com isso, o homem liga para a polícia e acabam descobrindo que o automóvel foi deixado no fim da rua, perto de uma fazenda. Ao chegar ao local e conferir o banco de trás, percebem uma manta azul cobrindo algo e, ao tirar, avistam o corpo sem vida do seu mais novo hóspede.

  Preocupado com o garoto, o pai lhe diz para manter distância, pois mais carros apareceriam mais tarde. Talvez pudesse ficar no banco de trás da viatura, mas a criança não aceita. Nesse momento, uma garota sardenta surge e lhe convida para ir até a casa da fazenda. É aí que nos é apresentada a Fazenda Hempstock. Lá, o menino descobre que o nome da sua mais nova amiga é Lettie Hempstock e acaba conhecendo a mãe e a avó da mesma – ou a nova e a velha Senhora Hempstock, como dizem. Eram mulheres misteriosas, pareciam saber as coisas sem ao menos fazer perguntas e tratavam tudo isso, mesmo assim, com muita naturalidade. Feliz com as novas pessoas que conhecera, o garoto acaba considerando a fazenda seu novo lugar especial.


   Apesar de que a morte do minerador de opala lhe deu a oportunidade de conhecer algo novo e que lhe fazia feliz, o acontecimento também causou sérios problemas: As pessoas estavam recebendo dinheiro dos modos mais peculiares – e perigosos – possíveis. Lettie, ciente da gravidade da situação, viu que precisava dar um jeito nisso e prometeu que cuidaria do amigo. Mas tudo poderia acabar saindo do controle.
                                                           ---
   Como ouvi muitas pessoas falarem, o livro realmente tem uma pitada de autobiografia, já que o personagem relata sua infância. O modo como Neil Gaiman escreve é diferente, impressionante. Ao mesmo tempo em que a atmosfera do livro é inocente – já que o protagonista, na maioria das cenas, é uma criança -, ela é sombria e te faz querer abraçar o garoto e dizer “calma, vai ficar tudo bem”. Em alguns momentos, senti uma agonia enorme por não poder fazer algo pra ajudar o protagonista, já que ele é ameaçado e corre perigo algumas vezes. A sensação é engraçada e eu me senti como em um pesadelo de criança, onde aqueles nossos medos antigos surgem novamente. Tudo parece tão real e sobrenatural simultaneamente!

   Fiquei um pouco confusa em relação a Lettie e as senhoras Hempstock, já que não somos informados sobre o que elas realmente são. Seria interessante se a história das mesmas fosse mais explorada, porém, deixei a avaliação como “cinco estrelas” mesmo assim. Eu acho que, na verdade, essa lacuna deixada sobre a vida dessas mulheres foi proposital, para que tudo ficasse ainda mais misterioso.

   Tive uma certa identificação com o personagem principal pelo fato de que ele sempre adorou seus livros e os usava como refúgio, diferente de muitas crianças da sua idade. É bonito o fato de que esses preciosos objetos eram seus companheiros, o fazendo aproveitar a luz que passava pela fresta da porta do seu quarto à noite para ler, quando seus pais achavam que estava dormindo.

“Desde pequeno, eu sempre pegava várias ideias emprestadas dos livros. Eles me ensinaram quase tudo o que eu sabia sobre o que as pessoas faziam, sobre como me comportar. Eram meus professores e meus conselheiros.”

   Preciso falar da edição? Olha essa capa e me diz se não é maravilhosa. A cor, a foto, as fontes... Tudo ficou muito bem em conjunto e passa a sensação necessária: aquela coisa meio sombria, mas, ao mesmo tempo, fascinante. A foto da capa aparece novamente nas primeiras páginas do livro e isso dá um toque especial à edição. No fundo, há uma outra foto que também combina muito com o enredo. E, ah! As folhas são amareladas, ufa.


   Tantas coisas acontecem durante a leitura e eu gostaria de poder falar sobre elas aqui, mas estragaria a surpresa de descobrir tudo aos pouquinhos. Não pense que a história se resume a isso, pode ter certeza que há muito ainda o que explorar, resolver e entender. Recomendo demais, pra qualquer pessoa. É um livro lindo! E o título, então? Depois que completa a leitura, faz todo o sentido do mundo e um nome melhor do que esse acaba parecendo impossível.


“Não tenho saudade da infância, mas sinto falta da forma como eu encontrava prazer em coisas pequenas, mesmo quando coisas maiores desmoronavam. Eu não podia controlar o mundo no qual vivia, não podia fugir de coisas nem de pessoas nem de momentos que me faziam mal, mas tinha prazer nas coisas que me deixavam feliz.”

(Volto aqui, após alguns meses que escrevi essa resenha, pra dizer que resolvi colocar esse livro entre os meus favoritos. A história me marcou MUITO e, até hoje, não consigo esquecer.)

2 comentários:

  1. Eu li esse livro! Tb gostei bastante, até hj fico pensando na historia... Tentando entender-la completamente. Mas acho que isso é a graça da coisa, né? Muito boa a sua resenha! Continue escrevendo! :)

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá, Aline!! Eu também penso na história ainda, não desgrudei, é fascinante. Exatamente, acho que era bem a ideia mesmo, hahaha. Muito obrigada, de verdade. <3

      Excluir

Comente para que eu possa saber se gostou ou o que devo melhorar! Dê sua opinião sobre o assunto falado também, se quiser. Sinta-se à vontade. ^-^